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Finanças querem fundo florestal a pagar bombeiros |
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Subsidios de Setembro podem vir a ser pagos com as verbas para a prevenção
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20-10-2004 - 09h55
Tiago Petinga/Lusa Em causa está uma transferência de cinco milhões para pagar aos bombeiros Os subsidios de Setembro dos voluntários que integram os Grupos de Primeira Intervenção (GPI), que estão em permanência nos quartéis durante a época de fogos, poderão vir a ser pagos pelo Fundo Florestal Permanente. A proposta foi feita pelo Ministério das Finanças ao Ministério da Administração Interna (MAI), que tem a tutela dos bombeiros. O pedido já chegou à Agricultura, que está a estudar a hipótese.
Produtores florestais, universitários e ambientalistas contestam a possibilidade e acusam o Governo de prosseguir uma política de \"tapa buracos\", desvirtuando o objectivo do fundo em questão, mais voltado para a prevenção.
O MAI confirmou ao PÚBLICO que esta hipótese está a ser estudada, concretizando que a proposta partiu do Ministério das Finanças. Em causa está uma transferência de cinco milhões de euros. O Ministério da Agricultura referiu ter recebido um pedido da Administração Interna, com parecer favorável do ministro das Finanças.
\"Está-se a avaliar como se pode encaixar este pedido e se se encaixa\", adiantou o gabinete de imprensa do ministro da Agricultura, Costa Neves. Caso seja autorizado, um quarto do total das receitas do fundo irão para os bombeiros.
Exigido há muito, o Fundo Florestal Permanente (FFP) foi criado em Março deste ano. Destina-se \"a apoiar a gestão florestal sustentável e inclui, no seu campo de intervenção, o apoio à prevenção dos fogos florestais, a estratégias de reestruturação fundiária, a acções específicas de investigação aplicada, demonstração e experimentação e a outras acções e instrumentos que contribuam para a defesa e sustentabilidade da floresta portuguesa\", lê-se na lei.
Entre as cinco áreas de intervenção previstas encontra-se uma alínea que fala em \"acções de primeira intervenção\". É por esta porta que as Finanças pretendem fazer entrar os bombeiros.
O fundo é financiado sobretudo por uma ecotaxa que incide sobre o consumo dos produtos petrolíferos e energéticos e as suas receitas não podem exceder os 30 milhões de euros anuais (ver caixa). Este ano não deverá passar dos 20 milhões, já que se perderam os dois primeiros meses.
Segundo a lei que cria o fundo, teria de ser aberta uma excepção para enquadrar o pagamento aos GPI, já que apenas \"são elegíveis as despesas efectuadas após a data de apresentação da candidatura\", podendo ser aceites \"despesas realizadas no período de três meses que antecede a data de apresentação da candidatura, desde que o montante em causa não ultrapasse 25 por cento do investimento total considerado.\" Nunca se garantiria, portanto, o pagamento integral dos salários.
Para cobrir alguns casos excepcionais, como foi o dos militares que patrulharam a floresta no Verão passado, foram celebrados protocolos entre o fundo e algumas entidades. Mas esse também não foi o caso dos GPI.
Reacções negativas
Tanto os bombeiros como vários intervenientes no sector florestal criticam a proposta das Finanças. Todos sublinham que o fundo foi criado para privilegiar a prevenção e não o combate.
João Soares, ex-secretário de Estado das Florestas e um dos responsáveis pela criação do fundo, lembra que a alínea da primeira intervenção foi criada para reforçar os meios dos sapadores florestais - que dependem da Direcção-Geral dos Recursos Florestais - ou criar um nova estrutura de prevenção, e não pagar estruturas pré-existentes, que têm como \"principal competência o combate\".
Também Carlos Morais, gestor do fundo e que ainda não tem conhecimento desta intenção, defende que \"o sentido da primeira intervenção é no âmbito das entidades que desenvolvem acções de prevenção\". Mas, adianta, \"pode estar aberto a outras interpretações.\"
\"Dizer que os GPI fazem tarefas de prevenção é uma interpretação forçada de quem em desespero de causa procura resolver um problema financeiro que devia ter sido resolvido aquando do planeamento do dispositivo de combate\", avalia o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, Duarte Caldeira.
Este responsável lembra que a prevenção dos incêndios não cabe aos bombeiros. \"Os GPI estão integrados no dispositivo de combate, o que por vezes fazem é vigilância preventiva nas áreas de risco, tentando identificar o fogo nascente e actuar sobre ele de forma rápida. Mas isso faz parte do combate\", explica.
Américo Mendes, professor da Universidade Católica Portuguesa e presidente de uma associação de produtores florestais, também contesta a medida. \"Isto é desviar o fundo da sua missão\", salienta. Recorda que os GPI já existem há muito tempo e sempre foram pagos com outras verbas.
Para Joaquim Sande Silva, da Liga para a Protecção da Natureza, a tentativa não passa de uma \"artimanha orçamental\", que pretende tapar buracos com o dinheiro do fundo.
Também José Miguel Lupi Caetano, dirigente da Associação de Produtores Florestais de Setúbal fala em \"tapar buracos\". \"Cortaram os fundos públicos para os sapadores florestais e agora vemos o MAI a fazer pressão para que a Agricultura pague brigadas que têm as mesmas funções dos sapadores\", critica.
O PÚBLICO tentou, nos últimos dias, ouvir o Ministério das Finanças sobre este assunto, mas não obteve qualquer resposta.
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Autor: José Palha |
Publicado em: 20-10-2004 (1731 Leituras, Votos 326) |
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